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#50. Pato Fu
Daqui Pro Futuro (2007, Rotomusic)
Enquanto Toda Cura Para Todo Mal (2005) posicionou o grupo mineiro em um espaço aberto a novas experiências, mantendo no teor ensolarado um princípio de evolução, Daqui Pro Futuro veio como um resultado oposto. Sombrio e consumido pela melancolia, mas ainda capaz de anunciar um cardápio de Hits, típicos da banda, o oitavo registro em estúdio do Pato Fu é uma obra em que a experimentação dá lugar à sobriedade. Dos versos pontuados pela solidão (Espero) ao uso de temas marcados pela proposta “paternal” (Mamã Papá), até uma amarga dissertação sobre a vida e a morte (A Verdade Sobre o Tempo), cada estágio da obra revela um espaço totalmente original dentro da estética do grupo. Se antes a banda apostava em um jogo radiante de versos e sons, ao dar início ao novo disco uma manifestação introspectiva desse resultado foi assertivamente anunciada. O excêntrico se “acomodou”, e o distanciamento, antes fundamental para a estética do grupo, passou a ser interpretado de forma a expandir os horizontes do coletivo mineiro.
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#49. Tom Zé
Estudando o Pagode – Segregamulher e Amor (2005, Trama)
Quase três décadas depois de entregar o clássico Estudando o Samba (1976), Tom Zé resolveu mais uma vez brincar com os gêneros no lançamento de Estudando o Pagode (2005). Ainda que o “gênero” exposto pelo músico no título da obra seja musical, é na na comunicação com o “gênero feminino” que o disco realmente se completa. Dividido em três atos específicos, o álbum passeia por diferentes aspectos da sociedade e sua relação com as mulheres, matéria que vai da segregação ao amor, como o subtítulo do disco logo entrega. De estrutura versátil, o álbum dança por elementos do samba, eletrônica além, claro, do anunciado pagode. São 16 faixas dissolvidas dentro do universo excêntrico do cantor, mecanismo que soluciona a composição de músicas comerciais (O Amor é Um Rock), ou mesmo canções de pura provocação (Mulher Navio Negreiro). Sem um ponto específico de concentração e ainda atento à própria ideia, o disco é mais um retrato específico do mundo aos olhos e sons de Tom Zé.
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#48. Suba
São Paulo Confessions (2000, Ziriguiboom)
No meio da expansão da cena Downtempo no meio da década de 1990, o sérvio Mitar Subotić, ou apenas Suba, não poderia ter encontrado um território mais fértil se não o brasileiro. Com nomes como Bebel Gilberto, Cibelle e Katia B a seu dispor, o produtor fez da curta passagem pelo país a sede para a construção de uma das obras mais atentas da eletrônica recente: São Paulo Confessions. Cruzando elementos do Acid Jazz, Bossa Nova e Trip-Hop, Suba fez do álbum um ambiente de reverberações amenas, mas não necessariamente estáveis. Como um passeio noturno pela cidade de São Paulo, o artista manipula nuances, brinca com a colagem de gêneros e carrega no grupo seleto de vozes a matéria-prima para um registro tão amplo, quanto econômico. Sublime, o disco se esparrama sem pressa, trazendo na interferência de Edgard Scandurra (Ira!) e até no resgate da obra de Tom Jobim e Vinícius de Morais a base para o jogo de texturas que se acomodam no interior do trabalho. Lançado internacionalmente em 1999, o disco só chegou ao Brasil no ano seguinte, meses após a morte de Suba – vitima de um incêndio em seus estúdios.
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#47. Violins
Grandes Infiéis (2005, Monstro Discos)
“Transformação”, “ruptura” e “desconstrução” são algumas das palavras que bem definem o universo em torno de Grandes Infiéis. Terceiro registro em estúdio da banda goiana Violins, o álbum quebra de vez a sonoridade melódica assumida desde Wake Up and Dream, de 2002, reforçando o que viria a ser encarado de forma muito mais amarga e política com Tribunal Surdo (2007). Do momento em que tem início, com Hans, até a chegada da derradeira Ok Ok, cada peça do disco escapa do isolamento confessional de Beto Cupertino, vocalista e principal compositor da obra, fazendo dos dramas cotidianos um mecanismo de sustentação do álbum. A história acinzentada que cresce por entre faixas como Ensaio Sobre Poligamia e Vendedor de Rins de forma alguma distancia o grupo dos contornos melódicos assumidos desde o começo de carreira, pelo contrário, esse resultado parece aperfeiçoado. O resultado está na explosão de músicas como Glória e Atriz, que mantém o engenho cru do novo repertório, mas resgatam traços da melancolia pop que a banda parecia assumir desde a estreia. Um último respiro antes da explosão que viria em poucos anos.
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#46. Vanguart
Vanguart (2007, Tratore)
Depois de uma série de registros caseiros e a repercussão positiva dentro do cenário independente, era hora da matogrossense Vanguart apresentar o primeiro trabalho de estúdio. Autointitulado, o registro é mais do que uma interpretação nacional da essência de artistas como Bob Dylan e Johnny Cash, mas a base do que definiria a cena folk brasileira pelos próximos anos. Guiado pelo timbre próprio de Helio Flanders e seus versos trilingues, o álbum encontra na confissão do cantor/personagem o princípio de sustento para a construção estética da obra. Dividido entre a exaltação – bem solucionada no single Semáforo – e o teor essencialmente melancólico dos versos, cada música do disco ocupa um princípio de reformulação dentro do isolamento autoral que ele revela. São canções que reforçam o isolamento (Para Abrir Os Olhos), olham com nostalgia para o amor (The Last Time I Saw You) ou lidam com a separação em uma atmosfera própria (Enquanto Isso Na Lanchonete). Um trabalho que guiado de forma explícita pelo isolamento, mas que dialoga de forma expressiva com as mais opostas bases de ouvintes.
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#45. Terminal Guadalupe
A Marcha dos Invisíveis (2007, Independente)
Versos políticos embalados por melodias pop. Na contramão de outros projetos guiados pela separação entre o “crítico” do “radiofônico”, a curitibana Terminal Guadalupe fez de A Marcha dos Invisíveis um exercício de comunicação estável com o público – sem qualquer distinção. Enquanto as letras de Dary Júnior passeiam por temas como corrupção, guerras e, claro, amor, as guitarras de Allan Yokohama esbarram na mesma atmosfera ascendente de grupos como Muse e o Radiohead pré-Ok Computer (1997). São arranjos melódicos, simples, mas enquadrados em uma atmosfera puramente acessível, como se o pop encontrasse novo significado nas mãos do grupo paranaense. Enquanto faixas como Pernambuco Chorou e El Pueblo No Se Va mantém a movimentação do disco em alta, outras como Cachorro Magro garantem pequenos respiros para a obra. Sobra espaço para uma das mais belas (e tristes) canções de amor da última década, De Turim a Acapulco, bem como o riff pegajoso de Atalho Clichê, prova da versatilidade e do brilho raro que caracteriza o disco.
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#44. Black Alien
Babylon By Gus Volume 1: O Ano Do Macaco (2004, DeckDisc)
Black Alien sempre foi um personagem isolado no Rap Carioca. Ainda que a relação com o Planet Hemp, Raimundos e Os Paralamas do Sucesso tenham expandido os domínios de Gustavo de Almeida Ribeiro, ou melhor, o Mr. Niterói, a sonoridade versátil e a expressiva relação com o reggae sempre posicionaram o rapper em um cenário musicalmente particular. Depois de uma sequência de canções feitas em colaboração com outros artistas, ou mesmo faixas nunca lançadas, Babylon By Gus Volume 1: O Ano Do Macaco marcou a estreia solo do artista. Centrado no universo próprio do rapper, o álbum encontra na essência de Bob Marley e outros cruzamentos instrumentais a base para uma obra ora mística, ora biográfica. São composições que caminham pelo cotidiano do artista, sem necessariamente aprisionar o espectador em um cenário hermético. Entre clássicos como Na Segunda Vinda e Caminhos do destino, Alien finaliza uma obra atemporal, capaz de resumir as transformações e todo o cotidiano da época, mas que estranhamente ecoam relação com o presente.
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#43. Ludovic
Idioma Morto (2006, Voice)
Idioma Morto é um disco que sufoca. A tristeza escancarada de Jair Naves, já expressa em Servil (2004), volta a se repetir de forma particularmente sóbria no segundo álbum da Ludovic. De vocalizações irregulares, gritos desesperados e um constante senso de aproximação da morte, cada música do álbum dança em um cenário de desespero e plena confissão. Se por um lado a crueza dada ao primeiro álbum desaparece por completo, por outro lado as emanações vocais de seu criador atingem um novo estágio – muito mais cênico. São faixas que falam (ou cantam) muito sem necessariamente precisar de grandes alegorias. Enquanto as guitarras mantém explícita a relação com o Punk/Pós-Punk inglês, os versos em português alicerçam uma pista soturna, princípio para a chegada de faixas como Um Grande Nó e Nas Suas Palavras. A tristeza escancarada do debut volta a se repetir por instantes em Janeiro Continua Sendo o Pior Dos Meses, último grito antes da massa densa que soterra melancolicamente o eixo final do disco.
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#42. Poléxia
O Avesso (2005, Independente)
Se a versátil cena paranaense dos anos 2000 tivesse de ser explicada em um único disco, o escolhido seria O Avesso, estreia da curitibana Poléxia. Íntimo da agitação que ocupava a cena estrangeira, mas não tão caricato quanto outros registros locais, o álbum passeia pelo rock (indie) e o pop (“alternativo”) sem necessariamente esbarrar em conceitos redundantes ou fórmulas prontas. Capaz de dialogar com o público médio, Rodrigo Lemos, vocalista e principal compositor da banda, formaliza um verdadeiro catálogo de músicas plásticas, mas que parecem durar além de um prazo específico de validade. A melancolia, princípio para o ambiente lírico do disco, ocupa os versos em um sentido contrário ao detalhamento clichê de outras obras do gênero. Seja no romantismo brega de Aos Garotos de Aluguel, ou na sobriedade de Quando a Luz se Apaga, cada música ocupa uma função específica para a consolidação da obra. Dessa forma, é possível ir da simplicidade acolhedora de Violetas na Janela, ao teor adulto de Melhor Assim, sem que haja um possível sentido de ruptura. O típico caso de um disco que assume o pop sem medo, com inteligência e versos difíceis de serem evitados.
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#41. Kamau
Non Ducor Duco (20008, Plano Audio)
Não Sou Conduzido, Conduzo. A frase em latim que dá título ao primeiro álbum de estúdio de Kamau, Non Ducor Duco, está longe de estabelecer um único ponto de comunicação do artista com a cidade de São Paulo. Urbano em essência, o disco funciona como uma representação do rapper e seu próprio universo – matéria-prima para o contexto lírico que ocupa toda a obra. Mais do que esbarrar na estética dos Racionais Mc’s ou quem sabe abrir passagem para a série de obras que viriam em poucos anos, o álbum é a transformação de Kamau em um personagem de si próprio, exercício que curiosamente emana forte aproximação com o ouvinte. Ainda que os temas políticos/sociais estejam presentes em toda a extensão do registro, cada faixa reforça o isolamento do artista, que entre o passado (Komwe) e o presente (Não Acredite Se Quiser) dialoga diretamente com as impressões mais particulares do espectador. Ponto de conexão entre antigos (KL Jay, Parteum) e novos (Emicida, Rashid) representantes do Rap Nacional, Non Ducor Duco reforça a nova fase do gênero. Contrariando a lógica do próprio nome – em idioma Swahili, “Guerreiro Silencioso” -, nunca antes Kamau falou tão alto quanto neste disco.
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